Diversidade 15 Anos: A Vitória do Talento e da Capacidade de Realização da TV Local
julho 27, 2022Produção audiovisual não é fácil, quem é do ramo sabe. Produção audiovisual local beira o heroísmo.
Desde 1963, ano em que a TV Borborema entrou no ar, sempre gostei de ver imagens locais nas telas locais. No cinema era quase impossível isso, mas a televisão trouxe essa oportunidade. Lembro muito bem que em sua fase experimental, a TV Borborema colocava uma câmera ligada enquadrando a rua João Pessoa do alto do andar vazado do edifício Rique, onde estava instalada. Era um plano geral, câmera imóvel, geralmente a partir do meio-dia, horário em que o comércio fechava para o almoço (sim, havia esse hábito) e a rua ficava deserta, no máximo um caminhão estacionado e, vez em quando, alguém entrava no enquadramento atravessando a rua. Para meu irmão Rômulo e eu que ainda não tínhamos completado os 11 anos, aquilo era um deslumbramento. Não a imagem em si, pequena na tela máxima de 19 polegadas e em preto e branco da época (nada comparável ao Cinemascope de 15 metros por 9, technicolor, do Babilônia, por exemplo), mas a imagem familiar da rua João Pessoa, aquele cenário que conhecíamos tão bem, agora contemplado naquele espaço onde só víamos o Pão de Açúcar, as pontes do Capibaribe, a Quinta Avenida de Nova York ou a torre Eiffel. Ficávamos horas ali, mirando e encantados com aquela imagem fixa, que confirmava a presença de Campina Grande na tela da TV. Era para nós como um espelho mágico.
Inesquecível também a transmissão “ao vivo” (com um caminhão de externas emprestado pela TV Rádio Clube de Recife) de uma partida amistosa entre Treze e Campinense, direto do Presidente Vargas, no dia 11 de outubro de 1964, quando a cidade completou 100 anos. Acostumados a ver os times cariocas em ação no “Canal 100” no Capitólio ou os times de Recife nas transmissões das TVs Jornal do Comércio e Rádio Clube, ver o galo e a raposa pela primeira vez na televisão foi uma emoção indescritível.
Nesses primeiros anos, a programação era predominantemente local, intercalada com “enlatados” que era como se chamava os filmes e seriados da época. Toda produção era em estúdio e ao vivo, as gravações em fita magnética só chegariam em 1968, mesmo assim em enormes e pesadas maquinas que não permitiam gravações externas.
Passados quase 60 anos, a realidade é bem diferente, especialmente no campo da tecnologia, mas certas limitações ainda permanecem. O predomínio das imagens do sudeste, no cinema ou na televisão, ainda é quase absoluto. E quando se fala em programação diária, aí é que esse predomínio se acentua. A formação das grandes redes de TV nos anos 1970, possibilitada pela transmissão via satélite, esmagou as televisões regionais e sua programação local, impondo uma programação totalmente produzida nas regiões mais ricas economicamente do País.
O que sobrou para as imagens locais foram pequenos espaços imprensados na grade nacional das redes, espaços limitados ao jornalismo fatual e esportivo. Aqui e ali uma brecha para uma entrevista em estúdio, com produção visual limitada a um cenário de fundo e duas poltronas.
Esse panorama perdurou até os anos 1980 do século 20, quando Rômulo Azevedo lançou na TV Paraíba, afiliada da Rede Globo onde os espaços locais eram (e são) mais que limitados, a histórica série “A Paraíba e seus artistas”, seis episódios de meia hora cada gravados em linguagem cinematográfica abordando a vida e a obra de Antônio Barros e Cecéu, Jackson do Pandeiro, Genival Lacerda, Zé Calixto, Abdias e Sivuca.
Essa peleja pela conquista de espaço na TV aberta para as produções locais ganhou um novo e qualificado impulso neste século 21 com a criação, no dia 31 do mês de julho de 2007, uma terça-feira, do programa Diversidade, da Rede Ita afiliada da TV Cultura.
Idealizado pelo dramaturgo e diretor teatral Saulo Queiroz, que também é o diretor de programação da emissora, o Diversidade é de uma ousadia que ainda não encontrou concorrência. Digo ousadia porque não tem melhor palavra para definir a coragem de se produzir um programa diário totalmente voltado para a arte e a cultura em pleno Nordeste, isso é mais que tirar leite de pedra, é reinventar o fogo a cada 24 horas.
O programa, como o nome diz, é bastante variado e abrange não só o trabalho artístico e cultural produzido em Campina Grande, as regiões paraibanas do brejo, do sertão, do cariri, do litoral e do curimataú também têm espaço assegurado no Diversidade.
As matérias, entrevistas, notas e a participação de colaboradores em quadros específicos, tudo é feito com esmero e notável dedicação.
Tive a oportunidade de colaborar na produção do programa, através de um generoso convite de Saulo, com o quadro semanal Cineclube (disponível no Youtube).
Hoje o Diversidade é apresentado em dois horários diários, a primeira edição é depois do jornal do meio-dia e a segunda vai ao ar antes do jornal da noite.
Eu que não perco uma edição, sou fã de carteirinha do programa, agradeço o esforço e a competência de toda a equipe da Rede Ita comprometida há 15 anos em manter no ar, com um alto nível de qualidade, esse verdadeiro oásis de arte e cultura que é o programa Diversidade.
É gratificante testemunhar ao longo da minha vida a evolução da presença da nossa gente, da nossa paisagem, do nosso modo de enxergar e traduzir o mundo na, ainda, cobiçada tela da TV aberta.
Parabéns e um abraço fraterno para você Saulo, extensivo a toda vibrante e mais que capacitada equipe de apresentadores, repórteres, produtores, cinegrafistas, iluminadores, motoristas e editores. E que venham mais 15 anos!
1 comentários
Olhar a cidade, enxergar lugares, lembrar histórias através da telinha e da telona, se ver parte da história e da geografia, reconhecer-se na diversidade e no Diversidade é fundamental. Mas como demonstra Romero Azevedo com sua escrita irretocável, não é fácil. Ele traz à baila, com sua clareza de Mestre, a questão da necessidade vital de elementos de identificação cultural para todos, democraticamente, além de destacar e elogiar o que acontece, apontando o possível, cotidianamente realizado com grande êxito. Parabéns ao Diversidade e ao Professor Romero Azevedo. Obrigada.
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